sexta-feira, 9 de julho de 2010

Parados no Tempo


A actriz Fedora é, como Margo Channing (Sunset Boulevard), Blanche Hudson (What Ever Happened to Baby Jane?) e, claro, Norma Desmond (Sunset Boulevard), a face (in)visível dos fantasmas do glamour da velha Hollywood. Isto é, antigas estrelas em queda, obsessivamente a tentar parar o tempo.

Se esta era uma fórmula que vendia (e que mais há a fazer para uma geração de storytellers em perdição do que narrar o supremo acto do seu desaparecimento?), também é verdade que estes eram os momentos que o cinema tinha para si, para reflectir sobre a sua condição. Seja ou não por ser o seu penúltimo filme, Fedora de Billy Wilder é, além da reflexão sobre a condição atemporal do estatuto de star, um lamento mais horrorizante do que nostálgico (com ecos em Poe ou mesmo no fabuloso Les Yeux Sans Visage de Georges Franju) sobre a nova face do cinema.

A “inabilidade” em gerir a informação nos dois enormes flashbacks que entrecortam o enterro da protagonista Fedora (o primeiro a mostrar o que se passou, o segundo a explicar como se passou), a colagem de temas antigos de Wilder (o núcleo de Sunset Boulevard mas também a Europa palco da libertagem e segredo de Avanti!), o excesso do comentário à pele sob um mundo em perdição, fazem de Fedora um dos filmes menos amados do cineasta americano.

Tudo isto é verdade em relação a Fedora. E é por isso que se trata de uma obra-prima admirável. A partir do momento em que o espectador já desvendou o mistério da morte de Fedora, sensivelmente a meio do filme, ainda nos sobra a outra metade, ilustrativa, que lida com o "como", sempre mais difícil de filmar.


Essa insatisfação que sentimos, de estatismo de plot, que é, arriscamos um prenúncio, aquilo que Wilder sente face aos “bearded guys” que estavam a tomar conta de Hollywood, é o supremo comentário sobre a passagem de testemunho do novo ao velho cinema. Mas é também a estrutura de Fedora a contar que as stars, tal como o mecanismo do cinema, vivem numa eterna presentificação do passado. O passado mexe-se, como os flashbacks de Fedora que é a única acção que se “mexe” no filme, e o presente, simulacro dessa ilusória perfeição, é inerte. Inerte como o presente da obra de Wilder, onde só há pessoas que falam em torno de um caixão.

E, por fim, esta é uma história de desfigurações. Se é verdade que uma mulher só se desfigura ao cometer suicídio quando “já não vive no seu corpo”, não é menos verdade que a desfiguração de uma star é, antes que a destruição de um corpo, a destruição de uma ideia.

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