VINGANÇA DE UMA MULHER, o último filme de Rita Azevedo Gomes, adaptado de um conto homónimo do romancista francês Barbey d’Aurevilly, ante-estreou este domingo, com bastante acarinhada recepção, na presente edição do Lisbon and Estoril Film Festival (LEFF).
Fiel ao texto original - a vingança inusitada da duquesa de Sierra Leone (Rita Durão) pela morte do seu grande amor – o filme carrega um estigma: um ritmo calmo e um tom solene e teatralizante, como em muito cinema português, sobretudo da década de oitenta e inícios de noventa. Contudo, a mise-en-scène, muito lúcida, aplica esse «peso», que é também o peso vertido em experimentação de trabalhar em estúdio, para uma inteligente fabricação de uma atmosfera de tragédia, vagamente lírica. Aí, o que poderia ser só o trabalho sobre o teatro, mas também sobre a pintura, se converte num hábil prolongamento cénico, espacial e atmosférico do cinematográfico. Nesse sentido, lembrámo-nos de Eugène Green por exemplo, nessa luta pela vontade de tornar o teatral e o cinematográfico como extensões um do outro.
Nessa extensão, e neste filme de Rita Azevedo Gomes isso salta à vista, o trabalho com os actores é fundamental. Na vingança da duquesa contada a Roberto (Francisco Nascimento), um bom vivant a quem já nada surpreende, pode encenar-se a tragédia de um amor mas sobretudo vive-se a tragédia da carne maltratada, dilacerada, prostituída, carne essa dada pelos actores, aqui pode dizer-se, num registo teatral, mas que o cinema transporta para essa noite de céu azul, essa passagem do cenário ao palácio, do adereço ao coração dilacerado.
Obra belíssima que, pela sua lucidez e amor pela tragédia do cinema como a arte dos corpos vertidos almas, ora em êxtase, ora em agonia, merece a devida atenção e consequente exibição comercial.
Para já, VINGANÇA DE UMA MULHER, única presença portuguesa na competição do festival, repete esta terça-feira, às 14:00, no Cinema Monumental em Lisboa.
Sem comentários:
Enviar um comentário