segunda-feira, 11 de julho de 2011

Como cães

«Julgo compreender-te - disse ela, e dependurou-se-lhe do pescoço, e quis dizer-lhe ainda alguma coisa, mas nada mais conseguiu dizer; e como estavam sentados mesmo ao pé da cama, bastou uma oscilação dos seus corpos para caírem em cima dela. E ali ficaram; desta vez, porém, não foi aquela entrega total da outra noite. Ela buscava alguma coisa e ele buscava outra coisa, furiosos ambos, os rostos contorcidos em esgares, enterrando a cabeço no peito um do outro como se o quisessem furar, buscavam, e nem abraços nem os seus corpos lançando-se um contra o outro os deixavam esquecer, pelo contrário: lembravam-lhes incessantemente o dever de buscarem; como cães arranham a terra desesperadamente, assim arranhavam nos seus corpos; e desamparados, desiludidos, na ânsia de buscarem ainda uma outra derradeira felicidade, lamberam muitas vezes a cara um do outro, com a língua toda. Só o cansaço lhes trouxe tranquilidade e mútuo agradecimento».

in O CASTELO- Franz Kafka

4 comentários:

  1. Pense num grande livro... Uaall!!!

    Belo blog.
    Cumprimentos cinéfilos!

    O Falcão Maltês

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  2. Comprei-o há tempos quando saiu no público mas neste momento ainda ando a ler o primeiro romance do Dostoievsky.

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  3. Álvaro, estás a falar do Gente Pobre? Nunca li.
    Obrigado António

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  4. Sim Carlos, é esse, é Dostoievsky ainda "verde" mas já se nota aquela explosividade dos personagens, a forte carga dramática e fora das normas sociais.

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