domingo, 7 de dezembro de 2014



No último capítulo do livro "[After the Media]", chamado "Be Offline and Exist Online", o teórico alemão dos media Siegfried Zielinski escreve sobre os utilizadores das redes sociais:

"They do not want to be merely associates within a functional mechanical network where the best possible sensation they can have is to be permanently wired. Their communicative activities are driven by the hope that the friendships in the technical beyond can perhaps be extended into the here and now of an experience. That there is perhaps someone on the other side who is capable of listening and who speaks the language that is not the same as that of the hard-nosed integrators and minute takers." (p. 250 Trad. Gloria Custance).

O meu problema tem a ver com a palavra "hope". A formulação de Zielinski parece estar simultaneamente dentro e fora do problema. Quer dizer, por um lado ele está "dentro" - a mediação constante que torna obsoleta a diferenciação mediática em detrimento da problematização da mediação enquanto objecto relacional  - mas parece projectar um "fora" - quando pensa que quem está dentro, inter-ligado, conectado, procura, deseja, um aqui e agora da experiência.

Parece-me que, precisamente, a questão se prende com essa anulação ou mutação da "esperança", de um ideal de felicidade que passe por um fora da mediação digital. Dando um exemplo um tanto simplista e boçal mesmo: os prisioneiros da caverna, acorrentados, não tinham consciência do que havia lá fora. Para eles não havia um mundo exterior. Para haver um dentro e fora, isto é, uma consciência hermenêutica de gestão de uma existência online mas de um ser offline, como parece advogar no fim do livro com o seu manifesto "Vademecum for the Prevention of psychopathia medialis", é preciso das duas uma: ou atacar o problema da formatação das fronteiras, onde o dentro consome a ideia do fora; ou ter uma perspectiva geracional de um antes e depois que nos permita apelidar a uma acção ecológica.

Zielinski parece estar na segunda das hipóteses. No nº 18 do manifesto escreve sobre a necessidade de redescobrir a viver o presente (p.260) e evitar aquilo que chama uma "arqueologia em tempo real" (p. 244), ou, no número seguinte, esclarece a importância de activar  um  "conscious split" entre essa existência digital e esse ser real, na conquista de uma relação profana com a integração digital. 

Esta solução, assente numa espécie de ecologia ou força de vontade ou carácter nietzchiano, deposita uma crença na aprendizagem de uma separação entre existir e ser, da construção de um fosso entre a exactidão cibernética e a individuação, na compatibilização entre a matemática e a imaginação.

Pela minha parte acredito mais na construção de mecanismos e artefactos que interrompam essa indistinção entre o dentro e o fora. Só assim, poderemos deixar de depositar demasiada esperança num discurso sobre a necessidade e o benefício do intervalo, da in-disciplinariedade, da intermitência, do entre imagens ou coisas. É preciso criar instrumentos que trabalhem nessa interrupção que criem a urgência, a necessidade para o engenho dessa tarefa. Esta trabalha contra a hegemonia técnica, mas sobretudo económica, do controlo estatístico e da governação algorítmica.

O problema dos media não é outro senão este, o da necessidade de encontrar uma estrutura que não faça correr o dentro pelo fora e viceversa, que interrompa a linha, a repetição, isto é, a técnica na sua velocidade pura e inumana.
 



 

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