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Não há tristeza em YOU’LL MEET A TALL DARK STRANGER. Há o contrário disso. Há uma alegria contida pela diversidade, pela ausência de sentido que a vida, e os filmes nela, podem e devem contrariar. A razão de ser desta baixa de popularidade de Allen entre o grande público não permite aplicar o chavão do envelhecimento, dos filmes feitos em série, etc. Ou melhor, permite trazer o envelhecimento como momento onde os filmes de Woody Allen largam a programação da gargalhada e enveredam por uma comédia subtil onde o sorriso substitui o riso, e sobretudo onde se inverte o centro da cinematografia de Allen: pela primeira vez, a «illusion» substitui a «medicine». Essa frase, que abre e fecha YOU’LL MEET A TALL DARK STRANGER, é uma espécie de fio condutor de uma visão, que de fora soa a nihilista e põe na condescendência, no esforço por «ficar bem», a tónica dos seus filmes.
Note-se: a relativização é, e sempre foi, uma estratégia de comédia. E nisto, Woody Allen não fugiu nunca à regra. Contudo, a relativização deixa de ser aqui ou em WHATEVER WORKS (2009) apenas veículo de transformação do sério em gag, convertendo-se ele próprio em gag da vida, em statement moral, ainda que não moralista. E é excepcional perceber que a maturidade a Woody Allen lhe trouxe a ideia de que a vida, sem arranjo, sem ordenação é já stand up comedy, que não existe distinção entre o mundo e a ridicularização do mundo. O mundo já é a sua comédia.
Habituados que estávamos ao desfile paranóico de Allen, como lidar com a sua serenidade, com esta ausência de impermanência afectiva? Não é só por uma questão de facilidade que os filmes de Woody Allen são hoje friamente recebidos. Uma das razões é que, em nosso entender, a «mensagem sábia» da relativização final, do placebo melhor que o remédio, é vista pela maioria de nós, com menos de 76 anos, como um ponto de vista venerável mas que resiste a ser compreendido a partir do seu interior. Por isso, aos nossos olhos, são Helena (Gemma Jones), no seu consolo astral, e Alfie (Anthony Hopkins), no seu consolo carnal, as personagens mais interessantes de YOU’LL MEET. Os mais novos, Watts/Brolin/Banderas/Pinto fazem todos parte de uma mesma máquina em pane do qual Allen parece já ter saído, de corrida atrás da própria cauda. Por isso, a extraordinária cena especular em que Roy Channing apanhando-se finalmente do lado de cá da janela olha da mesma forma ansioso para a janela da sua ex-mulher.
Todos erram. Os primeiros como condição de caracterização de uma etapa vivencial. Os segundos, finalmente, com certeza. É essa certeza, num cinema que sempre viveu da dúvida, que nos é hoje, ainda, difícil de acomodar.
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(queria pedir desculpa aos meus leitores por este interregno motivado por algum trabalho acumulado na universidade. Espero poder retomar a regularidade do blog nestes próximos tempos.)
é bom voltar a ler-te!
ResponderEliminarFoi definitivamente frutífero ler os teus pensamentos sobre o "You'll meet..", pois são, com toda a perspicácia e inteligência, muito mais generosos do que os com que estaria capaz de o dignar.
(Mas há outras estreias recentes com interesse para destaque. A ver se te copio a iniciativa e me faço mais regular, porque eu não tenho qualquer desculpa.)
saudações.
Obrigado, estou aqui para servir. eheh
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