quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Mas temos boas estradas! E não tínhamos

Manoel de Oliveira: Diz o filósofo que levou milhões de anos para que o homem chegasse à inteligência e ao pensamento. E hoje, por exemplo, a arte moderna é o inverso, desfazer tudo quanto foi feito, toda a ordem, método e tudo a que se chegou. Enfim a uma possibilidade de ordem, de crítica, de consenso. Um desfazer constante de tudo. Vai tudo para trás, para a desordem. É a liberdade. A qual na verdade nunca existiu, excepto nos animais selvagens.

Agustina Bessa-Luís: Mas oh Manel, se vivéssemos noutra época, possivelmente criticávamos essa arte que agora está a valorizar. Seríamos críticos dessa época, como somos da nossa. A crítica existe sempre em relação à nossa própria intervenção no mundo.

Manoel de Oliveira: Concerteza que sim, mas as épocas distinguem-se. Há épocas que são de construção e de formação e outras de desconstrução e de deformação.

Agustina Bessa-Luís: Mas temos boas estradas! E não tínhamos. Não?

Manoel de Oliveira: Para que servem? Temos estradas, aviões, submarinos... Isso é horrível.

in "Conversazione a Porto" (2006) de Daniele Segre



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