sábado, 3 de janeiro de 2015

Adivinha por que vêm jantar


Jantar às oito. Jantar às oito na Gulbenkian. Quem vem jantar às oito são os destroços, os efeitos, os resistentes da grande depressão, norte-americana, portuguesa. Cukor filma as vidas daqueles que se preparam para jantar mesmo não querendo ir. Os poucos que querem, querem-no por motivos pessoalíssimos. Não vamos ver jantar nenhum, as portas /o ecrã fecha-se antes dele começar. Não vemos esse destino malfadado, adiado, atrasado, incumprido. Cukor filmou esse pré-jantar não como uma comédia, nem sequer como uma comédia dramática. É um drama com sorrisos finos lá dentro, uma refeição lenta, de digestão difícil, onde se consomem as ideias do suicídio, da infidelidade, da doença, da corrupção, da falência. Só motivos para rir. Só motivos para resistir. Dinner at Eight fica-nos por esse conflito de problemas - a gelatina de carnes do jantar que cai ao chão ou a trombose coronária do chefe de família - ou por momentos minúsculos que têm a força do todo: a bochecha inchada da empregada, o ajeitar da luz de John Barrymore antes do suicídio ou as costas nuas de Jean Harlow. Tudo momentos amargos de "grande decepção" de uma suposta comédia sobre a grande depressão. 

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