terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Purgar




Em THE PURGE há uma visão para a sociedade "perfeita" de controlo e higienização de violência. O governo autoriza uma noite especial, doze horas, em que o homicídio é possível, legal e em que os instintos destruidores devem ser libertados para que tudo funcione pelo melhor nos outros 364 dias do ano. Set up que permite a celebração dionisíaca, de libertação dos constrangimentos civilizacionais e pulsionais. Quem quer dar um tiro ao patrão ou ao vizinho (que esfrega na sua cara o sucesso no trabalho) só tem de esperar pela purga anual.

Se o terror é na sua essência também ele uma purga, o espectador confrontado com esta sinopse pensa duas coisas. Primeiro, com pudor, vai reflectindo na contenção da violência como o máximo do controlo possível de uma estrutura societária que não se poupa a hipocrisias para manter o equilíbrio do ecosistema. Depois, esse mesmo espectador pega numa faca, corta essa glândula parasita chamada consciência, e começa a imaginar que o filme de James DeMonaco pode e deve mostrar todo o caos que essa purga permite. O terror só teria a ganhar.

Há uma certa desilusão então quando a opção é pela situação do encarceramento caseiro (um pouco como a esquadra de Carpenter) de uma família que não precisa de usar a purga para se libertar. Nessa invasão, os micro acontecimentos não estão à altura do contexto de base, as máscaras dos invasores querem sublinhar desnecessariamente o sadismo de toda a situação e o alvo principal, um negro sem-abrigo, surge apenas como clarificação pleonástica da discriminação e do diferente.

Tudo somado é o caos contido, o caos possível que parece, contudo, nos ser revelado pela via da ordem. Ainda assim darei uma chance ao segundo volume da purga, ao que parece transportada para o lá fora, o lugar por excelência de Dionísio e da libertação.



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