E quem sou? Também isso um mistério. Um leitor, um tipo que aos cinquenta e quatro ainda consegue usar (por maluquice e excitação face a uma manhã bonita de Verão) aquela parte exterior do pneu. Um tipo que há trinta e seis anos atrás, teve uma alegria súbita. Num barracão poeirento. Em Moleanos de Alcobaça. Preferia ficar nos sítios de pernoita aquando dos cortes de madeira. Poupava tempo. Havia desconforto é certo. Havia o dormir vestido, o banho apenas aos fins-de-semana. Havia o quase meio-quilo de toucinho assado e couves cozidas para o jantar… Mas havia também a liberdade de ler naquele ambiente improvável. Noite adentro, lendo o L’envers et le L’endroit de Camus sentia umas picadas estranhas. Incómodas. Pensando melhor no assunto, era natural. Ao lado, um barracão que servia de curral de cabras. Estava, este vosso criado, sujo, dorido Soliplass carregado (e cravejado) de pulgas. Esse, sou eu. Ali, finalmente um leitor a quem nem as pulgas podiam obstar.
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