É
inegável que face a Texas Killing Fields,
realizado por Ami Canaan Maan, a
filha de Michael Mann, existe a forte tentação de antecipar um talento “quem
sai aos seus”. Tendência reforçada não só pelo dedo do pai na produção do filme,
do argumento de Don Ferrarone (tecnhical
adviser em Heat e Miami Vice), mas sobretudo por se
tratar de uma obra que assenta nas mesmas paragens do policial. E não será
escandaloso começar a traçar hipóteses ainda que o futuro nos prove
errados. Como no universo de Mann pai, Texas Killing Fields exibe uma
atmosfera que extrapola do modus clássico
do género – o metódico procedimento para alcançar o criminoso - e que aqui é
sobretudo direcionada para o poder da lei (moral, cristã, de princípios) ante a
vastidão selvagem dos “killing fields” texanos. Desta feita, a primeira longa -
metragem de Ami Maan parece uma espécie de Blood
Simple de onde de retirou cirurgicamente o humor, deixando o negro e uma
dose maciça de curiosidade e crença. O seu par de protagonistas, os dois
detectives, o crente e o descrente ou o nova iorquino e o texano, avançam no
espaço para descobrir a identidade de um potencial serial killer. Contudo, esse mistério é consumido pela presença
desses campos, plenos de fumo, mortíferos (o espaço a indicar-nos o conflito, a
ser pedaço de um “viver baixo”, sem escrúpulos, vício texano). É nesta
contaminação espacial que evolui a mecânica
das personagens que querem ver, compreender ou refugiar-se desse estado de
vício. Neste, assiste-se a uma “máquina” psico-geográfica em ação: ela mata os
inocentes, mas também se auto-aniquila, oleada, prescindindo da ação policial.
Lembremos que em relação às mortes finais, a justiça é obtida por mão própria
dos “injustos”. É uma ideia ousada esta a da relação constitutiva do homem
interior pelo espaço que o habita, mas não particularmente inovadora: Ford fez
isso com o seu Monument Valley, mesmo Wim Wenders intuiu essa relação para
propósitos de libertação com Paris,
Texas. Contudo, esta intencionalidade de Ami Maan, o querer dar um passo
maior que a perna (leia-se perna aqui como algumas e naturais limitações
técnicas de Texas Killing Fields, desde o rendilhado musical a encobrir muitas
cenas, passando pelo digital de mão nervosa, ao slow
motion como efeito televisivo), augura coisas boas. E mesmo essas
limitações servem, não raras vezes, essa premissa de contaminação, de
eficiência policial e psicológica herdada de linhagem privilegiada. Exemplos? O
contraluz no interior das viaturas da polícia, as máquinas de fumo que quase “vemos”,
embora off, alimentam esse puxa-puxa
de cada detective a querer canalizar o filme para o seu espaço de conforto.
Esta angústia interior das suas personagens e desorientação espacial dos
valores permitem pensar um lugar primitivo onde pode crescer o talento de uma
cineasta. Lugar bem distante da histeria estética e procedimental que inundou o
género policial no local onde este ainda luta para sobreviver, a televisão.
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