Quero repetir esta canção até que o meu corpo a cante
O meu peito a compasse com os meus três ritmos danados. Uma ambulância passa, tão menos que uma nota, e lá dentro vão corpos sem vida, tão mais vivos. Tenho a emergência das coisas belas, de estar a morder e a rir as cores à tarde que não me deixa. Tenho que um passeio é o vazio e que o vazio me passeia.
Acordei com o sono da felicidade. Levantei-me com a calma das sirenes. Só não sonho porque me arrancaram a lucidez das patas. Sinto-me animal em toda esta conjugalidade. Entre entregar-me e asfixiar-me, posso bem dar mais um tempo ao minuto. Posso alimentar-me de amigos distantes, e foder a minha paciência pela noite dentro.
Posso querer morrer porque não sei. E se soubesse morreria, vivendo.
Que adiantam as cores vivas e os espelhos quando se é daltónico sentimental?
Que interessam os momentos lindos se eles não são maravilhosos?
Porque amar o nosso próprio filho se ele partiu para outras aventura, sem nós, sem nos dizer que.
Eu conheci o amor, essa rua mal frequentada, quando estava para sair. Quando a canção já não era repetida pelos meus pulmões, quando as pernas eram já cavacos enervantes, quando o último copo me sabia a saliva de eternidade.
Quatrocentos e dez são os anos que tenho para viver nestes quarenta, talvez menos, que me faltam. E nesses, a civilização do beijo está condenada à dormência dos espaços atafulhados de gente.
Estou atafulhado de mim. Rebento por dentro e nem há espaço cá fora para que desmaie ou cante. As portas que batem e as sirenes que aleijam têm milhares de significados. Nenhum é o meu.
Quero repetir esta canção até que o meu corpo a cante. Até que o meu corpo expluda esta mania de ser popular.
Quero que esta canção seja assim, a minha sentença de vida. Não há paz em se ter paz.
Encosto o rosto ao passeio e espero que tudo passe. Tudo.
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