quinta-feira, 1 de agosto de 2019

Pin-up exemplar




“A pin-up exemplar, imagem da mulher jovem ideal, renova a fotografia cuidadosamente retocada, enviada pela “madrinha de guerra”, essa noiva de morte, distante, intocável e na maioria das vezes desconhecida, já que só se manifesta ao soldado em cartas e encomendas que continham, além de outras “doçuras”, algumas relíquias da própria mulher, como madeixas de cabelo, perfume, luvas ou flores secas. Esta situação é ilustrativa da reflexão de Rudolph Arnheim sobre um cinema em que, depois de 1914, o actor se torna acessório e o acessório torna-se protagonista: de facto, numa guerra da qual ainda está excluída, a mulher tornou-se uma tragédia objectiva. O olhar obsceno lançado pelo conquistador militar sobre o corpo tornado distante da mulher é o mesmo que lança sobre o corpo territorial desertificado pela guerra, e procede assim directamente o voyeurismo do “realizador” quando filma o rosto da estrela como quem filma uma paisagem com o seu relevo, os seus lagos e vales que ele só tem de iluminar com uma câmara que, segundo Josef von Sternberg, inventor de Marlene Dietrich, atingia à queima-roupa… (…) Durante e depois da Segunda Guerra Mundial, a generalização do striptease (trocadilho com fitas de cinema e excitação sexual) indica as dimensões tomadas por esta transferência tecnófila numa sociedade que se militariza. Antes censurado, o striptease será imposto pelo exército em Inglaterra, nomeadamente com a célebre Phyllis Dixey. A dançarina que se despe em cena torna-se (tal como o soldado) um filme para os que a observam, soltando lentamente as peças de roupa como se fossem sequências, como os movimentos lascivos a fazer as vezes de imagens em fade out e a música de fundo como banda sonora.”

Sem comentários:

Enviar um comentário