Há poucas coisas mais chatas e inúteis do que actualizar um currículo. Quando corremos a memória para lá meter tudo o que seja digno de nota, parecemos um contabilista dos êxitos, um observador letal da vida que pouco ou nada deixa escapar. Ainda se raios de sol se arquivassem, ou o trejeito alegre da boca de uma amante surpreendida. Aí sim, talvez a coisa fizesse ainda algum sentido. Mas depois de tudo preenchidinho, mês a mês, ano a ano, quando percorremos aquela paisagem de pequenas e inúteis façanhas, há qualquer coisa de apaziguador. Agora somos contabilistas do tempo, lendas da nossa sociologia pessoal. Afinal foi isto que eu fiz à medida que se passavam os minutos e as tempestades. Uma coisa a seguir a outra, como um burocrata feliz, um tempo em que o tempo passou e eu passei com ele. Essa sociologia diz-me que não estive parado e isso é bom e basta.
"Essa sociologia diz-me que não estive parado e isso é bom e basta."
ResponderEliminarTendo a não conseguir concordar contigo, principalmente por me ter sucedido, recentemente, o imperativo de o actualizar e tudo o que senti foi a paragem do tempo, ronologocamente datada, mas principalmente pelo lado emocional: concluí que sou excedentária, descartável, tudo por ter optado pela dita 'Cultura'.
Doravante, serão breves missivas, statements (eu gosto de algumas expressões assim em mui breve) e um toque de:
- afinal, para quando, a entrevista, que eu necessito é de movimento? Hum?!
:)
A questão do descartável é sempre importante em termos da sociedade, mas afinal de contas (e independentemente de haver contas para pagar, bem sei) interessa sobretudo não nos tornarmos descartáveis para aqueles de quem gostamos. E para nós. O resto... enfim... Descartável e excedentário também remete para uma forma "correcta" de viver a vida e eu não acredito nada nisso.
ResponderEliminar"Descartável e excedentário também remete para uma forma "correcta" de viver a vida e eu não acredito nada nisso."
Eliminarprecisamente, Carlos, eu também não...