domingo, 22 de abril de 2012

A elipse renoiriania




A ideia panteísta de comunhão com a natureza, o espaço de inocência e completude na vida e no amor são traços da jouissance renoiriana que em Partie de Campagne (1936) se literalizam. Talvez por isso seja o filme que mostra de forma mais límpida a complexidade, o célebre “chacun a sa raison” contido na vontade de viver da melhor forma que cada um pode e sabe. O final entrecortado, alguns dirão abrupto, da obra, já mostra outra coisa. É a rememoração de um espaço onde se foi feliz. Para isso, o marido de Henriette surge grotesco, clownesco. Nele, como espelho, podemos ver plenamente os anos de tristeza que a jovem esposa viveu quando se casou. A dessintonia de destinos mal juntos como desfecho comum do naturalismo do francês. É sobretudo a luz talvez que nos mostra isso na conclusão, na “elipse” para a frente, no final de The Diary of a Chambermaid (1946) na qual Céléstine cumpre o desígnio do final feliz hollywoodiano, anti-Renoir, ao casar-se com o doente Georges. É essa luz “bouleversante” que nos revela que o plano inicial da protagonista foi cumprido (obter muito dinheiro e finalmente não querer saber do amor) e o “até que a morte nos separe” ganha então tons de ironia suprema. Num caso, o terceiro como espelho, como noutro, a luz reveladora, tratam-se de pistas, sintomas, de que a elipse em Renoir luta para vir a campo. Sempre tendo como desígnio clarificar ao espectador o “inclarificável”.

Sem comentários:

Enviar um comentário