“Si nous voulons savoir de quelle valeur sont les biens
de la Terre, considérons-les du lit de la mort : ces honneurs, ces
divertissements, ces richesses nous serons enlevés un jour. Il faut
conséquemment travailler à nous sanctifier et à nous enrichir des seuls liens
qui nous suivent dans l'éternité. (Saint Alphonse de Liguori).”
As pequenas coisas que levamos para a eternidade, aquelas
que constroem a nossa imortalidade, são as que Otar Iosseliani decidiu agarrar
com o belíssimo fresco rural que é Petit monastère en Toscane (1988). Há por certo um sentido de apaziguamento com o
mundo, quando se trata de filmar, em observando e em participando, dos rituais
quotidianos dos abades de Castelnuovo Dell’abate, perto de Sienna em Itália e
dos habitantes de uma vila vizinha na Toscânia. Para isto não há truques de
montagem ou outros. De quê serviriam? A neutralidade e peso da câmara
limitam-se a estar lá e a refazer actividades: a apanha da azeitona, o abate de
porcos, a limpeza da terra, as refeições, o tempo sem alegria ou tristeza. Os
pés das senhoras, de Cristo, as canções litúrgicas ou boémias, as festas
populares, tudo se sucede, sem dar azo a esse “monstro” chamado ritmo. É esse
estranho peso da neutralidade, da passagem, que contém em si o mistério das
coisas íntegras. Esse pecado de dar a ver a uma distância milenar e carinhosa
parece contrastar com a imaginação sem freio da ficção do georgiano. Este
aparente contraste de registos causa perplexidade, não fosse essa responsabilidade
bela, benigna, que é o traço condutor da visão de Iosselini. O autor confessa
que não sabe porque faz um filme destes, hoje, para quem, porquê? Nós não
sabemos tão pouco e isso é uma virtude.
Contudo, Petit
monastère en Toscane choca connosco, enquanto proprietários de um discurso
sobre a “perda,” embate nesse sentimento
ilusório ou real (?), de que algo está para acabar. E que esse fim será
irreparável.
No final do filme há a promessa de regressar aqui, vinte
anos depois, para retomar esta gente num segundo filme. Os vinte anos passaram. A medo, dizemos,
que Iosseliani ainda nos deve esse retorno.
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