quarta-feira, 31 de julho de 2019

E se parássemos de sobreviver?



“E sendo os relógios meros marcadores repetitivos de coisas que mudam sobre outras que duram, podemos falar de um tempo de processos humanos que se acelerou por referência a um tempo objectivo, cosmológico, imune à acção humana. Fazemos mais coisas, ou mais exactamente, fazemos acontecer mais ciclos de coisas (…). Mas isto de fazer mais ciclos de coisas não significa que aconteça mais, ou sequer o mesmo, nesses ciclos. Significa apenas que medimos muito mais o que nos acontece, que tornámos tudo mais contável, mais objectivamente mensurável e, por isso, também mais comunicável, mais partilhável, mais facebookável. A aceleração do tempo social serve um propósito muito objectivo de industrialização do acontecimento, tornando-o estruturalmente rentável, comercializável, unidade de troca, assimilado ao sistema produtivo (…). Neste processo de industrialização do acontecimento, estarmos obcecados por estar sempre a acontecer algo não faz com que aconteçamos mais. (…) Parar nas coisas tornou-se um mal tão grave como uma improdutividade económica superlativa, levada a todas as dimensões do nosso existir. Pelo contrário, tornou-se imperativo fazer-nos acontecer muitas coisas, tudo à semelhança do imperativo económico de produzir mais e mais em menos e menos tempo.”

E se parássemos de sobreviver? - André Barata

Sem comentários:

Enviar um comentário