sexta-feira, 5 de agosto de 2016

sopa de abraços


Talvez John Wayne imaginasse que depois de todos os duelos, aventuras e caminhadas da sua mui fordiana vida, houvesse um tempo para um sereno regresso a casa e às origens irlandesas, onde pudesse usufruir pacatamente de todo o esplendor do amor e da família. É que isso, pelo menos até 1952, ano deste The Quiet Man (O Homem Tranquilo, 1952) só ocorreu, hipoteticamente, após as letrinhas “the end”, num muito distante rancho que tínhamos de imaginar. Não podia ele estar mais enganado. Mas vim falar de abraços e ele aqui está: um dos mais comoventes da história do cinema. Maureen O’Hara nos braços encharcados de Wayne, ou devo dizer, a ruiva Mary Kate a ser protegida do vento, da chuva e dos maus augúrios do cemitério, onde se passa a cena, pelo ex-pugilista Sean Thorton. Se a cena é romântica não se pode dizer que o cineasta o seja particularmente, pelo menos com ele nunca foi um amor e uma cabana, ou neste caso, amor e uma cama partida. Longe das primeiras visões bucólicas – em que Sean vê Mary Kate como uma angélica “guardadora de rebanhos” – e da benção com água benta, a relação dos dois começa com ventanias de bater portas, janelas partidas e “assombrações” a entrar pela casa adentro. Por isso, não vale a pena enganar ninguém. Este abraço não chega a ser o clímax do romantismo idílico mas sim o manter junto, com força, aquilo que a natureza revolta quer separar. Ele, que já tanto lutou, vai ensinar-lhe que o dinheiro é para mandar para a fornalha e que mais vale plantar rosas. Ela, que já tanto esperou, vai fazer-lhe ver que nem só de rosas vive o homem e que nem o mais tranquilo dos homens deve abdicar de lutar pelo amor. E desses ensinamentos, ou entre um murro e um abraço, se faz o mais romântico dos filmes.

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