The Ring, indiscutivelmente um dos melhores senão o melhor Hitchcock da
fase muda, era o filme que o realizador considerava o seu verdadeiro
primeiro filme. Além do controlo pela primeira vez sobre o argumento, há
nele a obsessiva exploração da relação geométrica do círculo que se
"intromete" na triangulação amorosa. Já isso tinha acontecido com The Lodger com a brincadeira com as algemas e o anel. Aqui a circularidade é explícita: do anel do marido à bracelete do amante, do ring
de boxe no qual começa e irá acabar a história, em trajecto de volta desenhada. Há, talvez, uma acepção menos recorrente da circularidade em The Ring.
A exploração do argumento leva Hitchcock a fazer circular, por via da
manipulação narrativa, a ideia que o espectador tem de cada um deste
trio. A mulher que começa e está quase todo o filme em modo "adúltera"
para no final girar para a esposa fiel que se apieda com o esforço do
marido. Este que começa fanfarrão, a derrotar tudo e todos de um só
assalto, aprendendo por fim a humildade de conquistar aquilo por que se
luta. E, finalmente, o amante que vemos nas primeiras cenas numa postura
low key (ele não quer combater na luta inicial, é o outro que o
desafia) e que termina por não evoluir nessa heroicidade, visto em
festas, com mulheres, dando-nos a perceber que o seu hipotético amor
pela mulher seria uma atitude estática, indiferente a sofrimentos e
traições. Do vilão ao herói, do herói ao vilão, Hitchcock mostra a
circularidade implícita num dos seus temas, a ilusão das aparências,
fazendo triunfar o menor dos círculos sobre o maior. Se na cena do
casamento a bracelete cai sobre o anel, no desfecho de The Ring,
é o círculo maior, mais forte e vistoso, que é arrancado. Mais do que
moralismos casamenteiros este é um filme sobre "o meu círculo é menor mas maior do que o teu". Isto sem esquecer o poder do círculo de amigos do marido, personagens secundárias muito relevantes, que aqui têm um papel de coesão vital para suster a eminente queda do herói.
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