segunda-feira, 30 de novembro de 2015


Numa obra de psiquiatria, apenas me interessam as frases dos doentes; num livro de críticas, as citações.

E. M. Cioran

sábado, 28 de novembro de 2015


E se continuarmos a "descascar" Moretti, aos 35 anos já gritava, entre o desespero e a nostalgia, pela mãe e pelas merendas com chocolate que nunca mais voltariam.

O Ensaio Audiovisual e a Crítica de Cinema como Prática Criativa (Fevereiro 2015)


Projecções sobre Sherlock Jr. from Luis Mendonca on Vimeo.


O companheiro das lides walshianas, Luís Mendonça, vai co-dirigir um workshop na Universidade Nova dedicado ao tema "O Ensaio Audiovisual e a Crítica de Cinema como Prática Criativa". Não só porque vai ser de certeza um evento muito interessante, mas porque o Luís me convidou para assegurar uma das sessões, intimo toda a gente a increver-se o mais rápido que conseguir.

Mais detalhes do curso aqui
E inscrições aqui.


sexta-feira, 27 de novembro de 2015

distância = angústia = lucidez


No último Moretti, a perda da mãe é uma ameaça durante todo o filme. Mas não se quer nunca entrar nos processos das decadência, da doença que sobe de tom e a carne que deteriora. O que interessa é pensar nessa hipotética perda como algo que fará mudar a rota do Gps interior da realizadora protagonista. Neste sentido, a perda maior é apenas uma pedra maior num charco que comporta a toda a hora perdas menores, reequacionamentos de caminho. Parece impossível mas Moretti filma a experiência da morte da sua mãe com distância crítica, sobretudo porque percebe que, para aceitá-la, necessita de a colocar num processo mais vasto de perdas sucessividas chamado continuum da vida. Isto parece-me mais ou menos claro em Mia Madre

Menos certo é essa capacidade de filmar o seu passado (as lutas estudantis, as aguerridas certezas comunistas) com a mesma angústia proporcionada pela capacidade de as olhar hoje com a distância dos anos. E nessa altura, como haveria de ter sido? Fui ver Ecce Bombo e fiquei espantado com aquele travelling atrás (mais ou menos aos 20 min.) que começa por mostrar os estudantes da sua universidade no seu quarto a planear a ocupação da instituição. A câmara recua e vemos a personagem de Michele Apicella (Nanni Moretti) a observá-los inclinado na ombreira da porta do quarto. Mas a câmara continua a recuar e o espectador apercebe-se que no final do movimento de câmara, o pai de Michele, numa postura semelhante, reclinado junto à parede, observa por sua vez o filho. Circuito de olhares o que se desenha mas sobretudo um circuito de distâncias críticas. Moretti tinha apenas 25 anos quando fez Ecce Bombo mas a sua câmara já mostrava aquilo que podemos ver em Mia Madre: uma certa inquietação lúcida motivada pela capacidade de agir ao mesmo tempo que se dá um passo atrás para se ver essa acção, com uma distância de (in) segurança crítica.

terça-feira, 24 de novembro de 2015

kaput


segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Entrevista a Alain Bergala

Num encontro entre o surreal e o fantástico, num hotel ali para os lados da 5 de Outubro, fui conversar com Alain Bergala. 

(Não me peçam para contar o surreal que há histórias que só a futuros netos estão reservadas).

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

No matadouro, olhava, naquela manhã, os animais que eram conduzidos para o massacre. Quase todos, no último momento, se recusavam a avançar. Para os convencerem a fazê-lo, batiam-lhes nas patas traseiras.

Aquela cena vem-me muitas vezes à memória, quando, ejectado do sono, não sinto forças para enfrentar o suplício do quotidiano do Tempo.

E. M. Cioran

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Montanha

Sem margem para dúvidas, o melhor filme falado que fizemos até hoje. Conversa com João Salaviza sobre a sua longa-metragem, "Montanha".

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

O meu círculo é menor do que o teu



The Ring, indiscutivelmente um dos melhores senão o melhor Hitchcock da fase muda, era o filme que o realizador considerava o seu verdadeiro primeiro filme. Além do controlo pela primeira vez sobre o argumento, há nele a obsessiva exploração da relação geométrica do círculo que se "intromete" na triangulação amorosa. Já isso tinha acontecido com The Lodger com a brincadeira com as algemas e o anel. Aqui a circularidade é explícita: do anel do marido à bracelete do amante, do ring de boxe no qual começa e irá acabar a história, em trajecto de volta desenhada. Há, talvez, uma acepção menos recorrente da circularidade em The Ring. A exploração do argumento leva Hitchcock a fazer circular, por via da manipulação narrativa, a ideia que o espectador tem de cada um deste trio. A mulher que começa e está quase todo o filme em modo "adúltera" para no final girar para a esposa fiel que se apieda com o esforço do marido. Este que começa fanfarrão, a derrotar tudo e todos de um só assalto, aprendendo por fim a humildade de conquistar aquilo por que se luta. E, finalmente, o amante que vemos nas primeiras cenas numa postura low key (ele não quer combater na luta inicial, é o outro que o desafia) e que termina por não evoluir nessa heroicidade, visto em festas, com mulheres, dando-nos a perceber que o seu hipotético amor pela mulher seria uma atitude estática, indiferente a sofrimentos e traições. Do vilão ao herói, do herói ao vilão, Hitchcock mostra a circularidade implícita num dos seus temas, a ilusão das aparências, fazendo triunfar o menor dos círculos sobre o maior. Se na cena do casamento a bracelete cai sobre o anel, no desfecho de The Ring, é o círculo maior, mais forte e vistoso, que é arrancado. Mais do que moralismos casamenteiros este é um filme sobre "o meu círculo é menor mas maior do que o teu". Isto sem esquecer o poder do círculo de amigos do marido, personagens secundárias muito relevantes, que aqui têm um papel de coesão vital para suster a eminente queda do herói.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Pela minha parte, nada tenho de inspirado. Sou apenas um pobre homem que pousa no chão um pé atrás do outro, uma espécie de ratazana do saber, que rói um pouco mais, a cada dia que passa, o toucinho da verdade.

Roberto Rossellini

Agarrado

Todos os misantropos, por mais sinceros que sejam, nos lembram por momentos aquele velho poeta acamado e completamente esquecido que, furioso, com os seus contemporâneos, decretara que não queria receber nenhum deles. A mulher dele, por caridade, ia de quando em quando tocar à campainha.

E. M. Cioran

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Palavras que não fazem mexer os dentes

Há menos de um par de horas assistia, na expectativa de me fabricarem uma emoção e de informarem de como vai ser o mundo depois do 14 de Novembro, ao discurso de François Hollande perante os membros do Parlamento francês. Disse que não esquecia os rostos dos mortos e das famílias dos mortos, pediu para mudar a Constituição, cantou-se a Marselhesa, explicou os ataques de ontem à Síria. Entretanto, pouco depois, li este aforismo de Cioran, que começo timidamente a ler por recomendação do Vasco e do Pedro:  

O que me estraga a grande Revolução é o facto de tudo nela se passar num palco, de os promotores serem comediantes natos, e de a guilhotina não passar de um cenário. A história de França, no seu conjunto parece uma história feita por encomenda, uma história representada: tudo nela é perfeito do ponto de vista teatral. É uma peça, uma sucessão de gestos, de acontecimentos que são contemplados em vez de serem experimentados, um espectáculo com dez séculos. Daí a impressão de frivolidade que nos dá até mesmo o Terror, visto de longe.
 
Não vou tão longe até porque nem queria correr o risco de me encherem a caixa de comentários a dizer que sou insensível e coisas assim. Não é aliás, de facto, disso que se trata. Trata-se apenas e tão só de perceber de onde vinha esta minha sensação de que na boca de Hollande, as palavras "dureté" et "impitoyable", para descrever as reacções francesas ao ataque, não lhe fazem mexer os dentes. E, bem vistas as coisas, ainda bem.

domingo, 15 de novembro de 2015

Maturidade

Augusto M. Seabra perguntou a Nanni Moretti se o conceito de maturidade tinha hoje algum sentido para ele. Este disse-lhe que maturidade enquanto mudança radical não, nem enquanto serenidade. Talvez como maior tolerância, admitiu. 

Pergunto-me em que momento a serenidade do estoicismo se terá tornado um exclusivo do clin d'oeil da meditação zen e do yoga prêt-à-porter do ocidental à procura de uma portinha para descansar dos fumos e das atribulações. Pergunto-me ainda sobre o momento em que a tolerância de Voltaire se transformou num discurso máscara para o exterior, enquanto se prepara a vendetta, na sombra de uma suposta maturidade, pessoal e civilizacional.

Não me levem a mal, eu só queria ser tolerante, sereno e mudar radicalmente. Mas maduro é que não. Reservo, por enquanto, tal qualidade às frutas que, de tão tolerantes, ora se apresentam no grau mais elevado da sua doçura, ora enegrecem e se preparam para desaparecer, lançadas à terra.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

A minha visão da carne é a de um coveiro bafejado pela metafísica... 

E.M.Cioran

sábado, 7 de novembro de 2015

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

María África Antonia García Vidal de Santo Silas ou a rainha do technicolor


Nos Caminhos da Infância

A semana passada assisti à primeira parte do ciclo "Nos Caminhos da Infância" na Fundação Calouste Gulbenkian, com a participação de Alain Bergala, Marcos Uzal, José Manuel Costa, Teresa Garcia e Maria Luís Borges de Castro.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015


domingo, 1 de novembro de 2015

Pane



Entre a incrível obra prima que vi ontem, a trilogia da infância de Bill Douglas, e os planos de Van Damme a lutar meio cego no final de Bloodsport, o meu cérebro está como o tempo. Alagado, à espera de processar tudo, à espera de uma aberta de sol para colar os pedaços que entretanto, tenho a certeza, se partiram.