sábado, 19 de dezembro de 2020

Chegar a tempo



Sempre admirei as pessoas que conjugam o seu dia como um complexo calendário que depois cumprem à justa, ajustando os minutos, cortando a gordura dos atrasos ou das esperas. Invejo a capacidade de aproveitar o tempo, mas nunca me julguei capaz de o fazer. Porquê? Pelo motivo tão simples que fico bastante nervoso quando estou na iminência de chegar atrasado a um sítio. Nesses momentos sou o Hitchcock na presença de um polícia, medo de me apanharem em falso, receio de falhar. O resultado é que, sempre que posso (e cada vez menos o posso) acabo por chegar com antecedência aos meus compromissos. E fico ali naqueles minutos, antes de tudo começar, nessa espécie de segurança, a respirar fundo, inspirando bem esse tempo vazio. Talvez por isso, sempre achei horrível chegar atrasado aos filmes no cinema. Ou chegar atrasado aos filmes em casa, como quando alguém fala connosco nos primeiros minutos e perdemos a abertura. Invariavelmente, tenho de puxar atrás e começar novamente, pontual ao compromisso. Deposita-se muita energia nos cinco minutos finais dos filmes, mas é nos primeiros cinco que toda a aventura começa. Nessa pura potencialidade do desconhecido, vive-se o máximo da liberdade. E é preciso chegar à liberdade a tempo.


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