Nova crónica Raccords do Algoritmo
1922. (eu ainda não era nascido.) Salomé tinha dito a Jokanaan: “O teu cabelo é como as longas e negras noites quando a lua esconde a sua face”. (mais tarde a lua esconder-se-á, de facto, e já será tarde demais.) Ele afasta-a com um gesto de braço, brusco e mudo. “Para trás! Não profanes o templo do Deus.” Mas Salomé volta à carga: “A tua boca é como uma jóia de escarlate numa torre de marfim.” Mas não havia nada a fazer, o anjo da morte sempre estivera entre eles. Ela há-de pedir-lhe um beijo, ele recusá-lo-á várias vezes, chamando-a de “filha da Babilónia”. (eu reparava nas jóias iluminadas do seu cabelo encaracolado, no rosto irritado da actriz Alla Nazimova e nos mamilos pintados do aio). Despeitada, Salomé dançará para o tio babado, Herodes, para que, depois de meneares ululantes e véus provocantes, ela lhe possa pedir o que quiser. E ela quis, sabemos, a cabeça do seu querido Jokanaan, numa bandeja. [...]
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